ENGRAXANDO SAPATOS - Eu ia para a cidade e ficava no cruzamento das duas principais ruas, porque ali passava a maioria das pessoas a pé. Muitos que queriam engraxar os sapatos não acreditavam que eu seria capaz de engraxar os sapatos deles direito
Meu pai procura sempre arrumar um emprego para meus irmãos assim que ele entende que já podem trabalhar. Mas nem sempre ele consegue, outras vezes ficam no trabalho por pouco tempo, talvez porque são novos ainda. Eu comecei a engraxar sapatos quando era bem novo ainda. A caixa de engraxar sapatos era do meu irmão mais velho, foi feita na empresa onde meu pai trabalha. Quando meu irmão arrumou outro serviço, passou a caixa para o irmão mais novo. E foi assim passando de irmão em irmão. Agora foi passada para mim. Todos meus irmãos já foram engraxates antes de arrumar o primeiro emprego e agora chegou minha vez. Eu ia para a cidade e ficava no cruzamento das duas principais ruas, porque ali passava a maioria das pessoas a pé. Muitos que queriam engraxar os sapatos não acreditavam que eu seria capaz de engraxar os sapatos deles direito. Achavam que eu era muito novo. Alguns perguntavam pelo meu irmão que engraxava antes de mim, porque ele não estava engraxando mais sapatos e eu dizia que ele tinha arrumado outro emprego. Com isso eu não engraxava quase sapatos nenhum. Acho que porque as pessoas não acreditavam que eu daria conta de fazer direito ou porque tinha que ficar em pé para engraxar os sapatos. Alguns outros engraxates que também engraxavam ali na cidade tinham cadeira para a pessoa que fosse engraxar se sentar, mas eu não tinha cadeira. Já era difícil para mim carregar a caixa e não conseguiria carregar uma cadeira também. Meu pai achava que a culpa era minha, que eu devia estar brincando em vez de estar procurando quem quisesse engraxar sapatos. Com isso ele mandou que eu não ficasse parado na esquina esperando as pessoas, que era para eu sair pelas ruas e assim mais pessoas poderiam me ver com a caixa de engraxar e eu poderia ganhar mais dinheiro engraxando sapatos. Com isso eu não ficava parado na esquina mais, e saía com a caixa, que era relativamente pesada para mim, pelas ruas da cidade. Andava pouco e parava para descansar, pois ficar carregando aquela caixa, que não era pequena, cansava. Não mudou muita coisa de antes. Tinha dia que não engraxava nenhum sapato e tinha dia que era uma só pessoa que pedia para eu engraxar os sapatos dela. A maioria não acreditava que eu conseguisse engraxar direito. Como para meu pai a culpa era sempre minha, ele decidiu que iria arrumar outro serviço para mim. Mas até que ele decidisse o que eu ia fazer, continuei na cidade com minha caixa de engraxar sapatos, ainda que não engraxasse sapatos de ninguém.
O Último Filho (Baseado em fatos reais)
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